2003/11/29

"A Arquitectura em Tempo de Viragem"

Este foi o tí­tulo do texto publicado no Público esta semana pela Bastonária da Ordem dos Arquitectos (e também deputada), Helena Roseta.

Este texto aponta claramente diversos problemas que os arquitetos enfrentam hoje em dia. Sendo que o principal deles está ligado ao facto de cerca de 7000 arquitectos (do total de 11 mil existentes em Portugal) terem menos de 40 anos, percentagem ainda maior na Secção Regional Norte, onde 80% dos arquitectos têm menos de 40 anos!
E, tal como venho apontando há algum tempo, as condições legais que os arquitectos têm para exercer a sua profissão são hoje similares àquelas que dispunham quando nasci em 1972!

Os arquitectos são, e assumo claramente o que digo, o parente pobre da indústria da construção! Cada vez tenho mais a certeza que toda a gente ganha neste mercado: os promotores, os vendedores, os construtores, os engenheiros e os trabalhadores... Todos menos os arquitectos!

E se é verdade que há um Gehry que recebe milhões de Euros, ou um Taveira que embolsou alguns milhões com os estádios ou um Siza ou um Souto Moura ou outros que à custa do nome que souberam construir junto da imprensa podem hoje "vender" esse mesmo nome para "viabilizar" obras que à partida um promotor (público ou privado) não conseguiria fazer passar pelo crivo da apreciação técnica de um qualquer departamento camarário, o que é facto é que a grande maioria dos arquitectos nunca na vida irão conseguir ganhar tanto dinheiro quanto apenas uma obra de um dos nomes que acima citei... E para piorar a situação, como muito bem diz a Bastonária no texto que citei acima, o "que se vende (.../...) é uma arquitectura medíocre, que não pode deixar de afectar a qualidade de todo o tecido urbano. Ou então, acrescento eu [Helena Roseta], o nome de grandes arquitectos é usado para alavancar operações imobiliárias e tornear procedimentos legais. O resultado não favorece a cidadania." Aliás, o Miguel Sousa Tavares, neste texto também no Público, faz uma critica veemente a esta situação e com uma frase que considero excelente, por ser muito explicita e conseguir resumir muito bem a "coisa"; diz então Miguel Sousa Tavares: "Eu não quero, e duvido que algum lisboeta queira, o projecto, seja ele qual for, nem as torres do arquitecto Siza Vieira. Tenho muito respeito por ele, mas entendo que o respeito pela cidade e pelos que aqui vivem é mais importante do que o respeito pela obra dele. Não quero ser esmagado pelo seu génio, que todavia não serve às pessoas mas apenas a si mesmo (...)". Agora digo eu: por norma, estes grandes arquitectos perdem a noção da realidade e para impor os seus projectos acabam por "estourar" orçamentos (por exemplo, Casa da Música no Porto) ou abrir enormes polémicas com os cidadãos e utilizadores do espaço arquitectónico criado que é pensado em função do criador e não do utilizador.

É por isso que é importante que o Governo siga a recomendação da Assembleia da República e concretize a alteração do 73/73 de forma a que a Arquitectura seja apenas praticada pelos arquitectos. Para os (nos) responsabilizar. Para lhes (nos) dar mais e melhores condições de poderem (podermos) ter uma profissão que lhes (nos) permita viver com dignidade a trabalhar naquilo que escolheram (escolhemos) e em que se licenciaram (licenciamos). Como muito bem diz aqui o Lutz, no Quase em português: "Aconteceu-me há uns anos atrás que uma assistente social, cuja tarefa era apreciar candidaturas à bonificação de propinas do infantário, onde o meu filho andava, recusou a nossa por simplesmente não acreditar na declaração IRS nela incluida. Não conseguia acreditar, que uma pessoa com curso superior, profissional liberal e então não desempregada, não ganhava pelo menos o mesmo que ganha qualquer funcionário público com equivalente formação! Mas era mesmo verdade.". Infelizmente, esta descrição retrata muito bem a vida da grande maioria dos arquitectos com menos de 40 anos...

Enfim, espero que tudo isto seja abordado e debatido no Congresso da Ordem dos Arquitectos que está decorrer aqui em Guimarães. Apesar de querer participar, estive impedido de o fazer por razões profissionais que me prenderam, inadiavelmente, ao trabalho. Mas acredito que os meus colegas que lá se encontram saberão ver nestes problemas as causas para uma batalha por um futuro melhor.

Para a semana, se conseguir disponibilizar um pouco de tempo, pretendo falar no meu texto para a Linha de Rumo a publicar no Noticias de Guimarães, sobre áreas metropolitanas.
Não vou abordar o mapa que se está a desenhar aqui na região onde Guimarães está inserido. Porque já o fiz aqui e agora pretendo abordar é o projecto para a AM do Minho (ou antes, e deixando um lamiré, a falta dele...) e qual a razão de eu ter passado de um entusiasta defensor para um descrente da descentralização...

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