2011/07/08

Encontros Guimarães 2012 - Arte e Arquitectura

Fui hoje, pela primeira vez, a um dos vários encontros temáticos que têm vindo a decorrer no âmbito da apresentação da programação da CEC2012.

Porque desconfiava que não ia gostar do que ia ouvir, abstive-me de participar até ao momento - mas desta vez quis ir por ser da "minha" área. E se calhar, o melhor era ter ido à sessão do Luís Miguel Rocha na avenida central em Braga recolher a assinatura no livro que me falta...

Enfim...

Antes de mais, devo dizer que do ponto de vista meramente teórico, a programação está bem pensada, isto é, tem uma linha condutora e uma filosofia interessante. E que me parece bem sair do centro da cidade e dos sítios do costume (Vila-Flor, Paços dos Duques, SMS) para expor arte, usando por exemplo uma antiga fábrica (da Asa, neste caso) para o efeito.

Mas, infelizmente, as boas notícias acabam aqui.

Porque depois de assistir ao "encontro" onde durante hora e meia foram debitadas banalidades pseudo-intelectuais pós-modernas sobre arte, públicos e audiências e sobre a forma como o olhar "de fora" se vai mostrar e residir em Guimarães, para benefício dos "locais", num discurso florentino e fechado a quem não é das artes, intragável, começaram as más noticias.

Como intragável foi perceber que do ponto de vista da CEC2012 não há arte e arquitectura de Guimarães, ou artistas e arquitectos que merecem mostrar ou ser mostrados na CEC2012. E que só há arte pós-moderna, intelectual, com um papel onde se explica que aquilo que o público vai ver é arte. Ora são fotógrafos que vêm "de fora" olhar para Guimarães, "na esperança" que resulte um olhar diferente, ora são pintores "de fora" que vão mostrar pintura que o comissário não sabe o que é porque ainda vão a meio do processo criativo, ora são reflexões sobre "urban beings" (que não sendo de Guimarães, pelo menos e menos mal, estiveram profissionalmente ligados cá), ora são concursos de ideias internacionais para que os "de fora" venham deixar ideias para os espaços públicos de Guimarães... Mas o famoso e cada vez mais irreal envolvimento de Guimarães, será apenas e só como público. Porque não há forma de se encontrar vimaranenses aqui sem ser no público. Há enormes reflexões filosófico-artísticas sobre o pós-modernismo, a pós-industrialização. Mas não há uma referência ao enorme legado de arte e arquitectura do concelho, não é mencionada a ideia de roteiros de arte e arquitectura no concelho, que podiam ser por temas (religiosa, ou industrial, ou arqueológica...) ou por épocas (pré-história, medieval, tardo-barroca, século XIX, modernidade...), não há referência a nomes vimaranenses das artes e cultura (por exemplo, Martins Sarmento, José de Pina, José de Guimarães...) e o mais próximo que há é uma homenagem a Nuno Portas (ligado a Guimarães pelo apoio profissional ao planeamento da cidade pelo PDM) mas de uma importância muito menor, por exemplo, que Fernando Távora - ligado da mesma forma a Guimarães mas pelo Centro Histórico e que, pelo menos, não habitando em Guimarães, tinha cá uma residência...

Menos mal que José de Guimarães terá direito a um espaço próprio, pelo menos por um ano, prazo do comodato acordado para expor as suas obras da colecção pessoal e que ao menos um vimaranense das artes teve direito a expor o seu trabalho na CEC2012...

Só se falava da forma como os "locais" teriam oportunidade de ver excelentes artistas e o seu olhar "de fora"... Que os "locais" iriam até Serralves devido a um protocolo com o Museu para "aprenderem" a apresentar as exposições...

Confesso que não sendo eu nascido em Guimarães, mas sentindo a cidade como minha de adopção por nela ter vivido e estudado desde tenra idade, me enervou a forma quase depreciativa como eram tratados os "locais". Como os "de fora" viriam dar o seu contributo às artes e arquitectura, que forma pedagógica, ensinar a ver arte.

Eu que sou local, pergunto-me se eles sabem que antes de virem os "de fora" já em Guimarães havia arte, arquitectura, artistas, arquitectos e público que sabe apreciar arte. Será que eles sabem que há um museu de arte primitiva moderna em Guimarães há muito tempo? Ou que Martins Sarmento fez da arqueologia uma expressão maior do legado artístico dos primitivos vimaranenses quando ainda quase ninguém em Portugal sabia o que era arqueologia? Será que eles sabem que há centenas de igrejas no concelho que sendo muitas vezes obras de arquitectura excepcionais de várias épocas, são ainda portadoras de peças de arte fantásticas, desde tapeçarias e esculturas, passando por iluminuras, livros e pinturas? Será que conhecem as casas senhoriais de enorme riqueza arquitectónica e artística? Será que a arte é só arte moderna? E será que eles sabem que em Guimarães há várias peças de arte moderna - edifícios, decorações, estátuas - de enorme valor artístico e arquitectónico? Se calhar, não sabem, porque passaram tempo demais a olhar para os "de fora" para saberem o valor dos "locais".

É lamentável. Como é lamentável, a menos de meio ano do inicio da CEC2012, ouvir a programadora dizer "n" vezes que "não sei", "acho eu", que os "nomes não são definitivos", que "tudo pode mudar".

Em condições normais, não pode. Em condições normais, neste momento já não devia haver dúvidas. Em condições normais, neste momento já deveria estar a ser publicitada a programação. Mas a preparação desta CEC2012 segue há muito os caminhos da anormalidade, portanto nada mais é anormal...

Por essas e por outras é que a Fundação Cidade de Guimarães fala em 1,5 milhões de visitantes à CEC2012 durante um ano que esta dura e que Óbidos, uma pequena vila da dimensão de uma das nossas nove vilas concelhias, recebe anualmente 2 milhões de turistas com apenas 3 festivais - a vila Natal, a feira do chocolate e a feira medieval! Dá que pensar, ou não?

"Tudo se transforma", diz a imagem. Mas é de mim, ou está a "imagem" um pouco desfocada?

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