2011/03/29

Arquitectos: Francisco Castro Rodrigues

Este vestuto senhor foi (quando no activo, porque ainda é vivo e inscrito na OA com o n.º 58!) um dos mais brilhantes arquitectos portugueses a trabalhar em Angola, tendo à sua conta gisado boa parte da cidade do Lobito e ainda deixado marcas em vários outros locais.



Após a independência ficou em Angola e assumiu-se de pleno direito como angolano, tendo trabalhado activamente até ao final da década de 80, tendo só então regressado a Portugal, onde ainda hoje vive em Azenhas do Mar.

Muitas das mais bonitas obras que pude visitar foram da sua autoria, obras de uma modernidade fantástica e dotadas de um saber e soluções para responder ao clima tropical que ainda hoje são avançadas (e por isso utilizadas), sendo um arquitecto muito à frente do seu tempo. Como aliás foram vários, como o já aqui mencionado Frederico Ludovice.

Por indicação da minha leitora Maria Amorim, descobri uma pequena reportagem sobre este arquitecto que me levou a várias outras páginas com informação variada sobre ele.


Tudo começou por uma noticia da Ordem dos Arquitectos que indica que este Arquitecto recebeu, recentemente, o prémio SP-AICA 2010, sendo ainda possível encontrar mais coisas no site Buala pela colega que venceu o prémio Távora em 2008/09, Cristina Salvador, e no Jornal dos Arquitectos (JA n. 234), pela colega Ana Vaz Milheiro.

"A obra do arquitecto Castro Rodrigues
Em meados do século XX, os colonialismos africanos – e em especial o colonialismo português – são alvo de cada vez maiores pressões ao nível internacional. Neste contexto, a estratégia desenvolvida e posta em prática por Portugal em Angola incluiu o investimento nas colónias, quer a nível da melhoria das infraestruturas quer ao nível da imagem de um colonialismo modernizador e vanguardista. A tradução desta estratégia, ao nível arquitectónico, passou pela planificação urbana e pela edificação moderna e de vanguarda – esta última extremamente reprimida na metrópole pelo regime de Salazar que apostava numa visão tradicionalista e revivalista – tentando assim disseminar a imagem de uma colónia que pretendia desenvolver e melhorar as condições de vida das populações em Angola. Em todo o caso, alguns arquitectos que trabalhavam para o regime como foi o caso de FCR puderam aproveitar a sua localização fora da metrópole para contestar com a sua obra a visão colonial. A análise da obra de FCR principal arquitecto da cidade do Lobito – onde se situava o maior porto angolano, quer em termos de dimensão quer das trocas comerciais aí realizadas – permite a constatação do nível do investimento realizado pela colónia e também o conflito existente com a administração colonial. Um dos testemunhos deste conflito é a planificação da cidade de forma que contrariava a divisão espacial/racial prevista pelo estado colonial e o novo plano do Lobito do final dos anos 60, baseado nos conceitos do urbanismo moderno da “Carta de Atenas”.

Durante (mais de) trinta anos FCR ofereceu o seu saber e as suas convicções, experimentados no terreno, à colónia portuguesa e mais tarde à jovem República Popular de Angola. A condição política do território em nada alterou o seu modo de projectar, a atenção e o empenhamento que investiu em todos os trabalhos que conduziu, apoiado num princípio simples, “temos uma realidade objectiva local que temos de melhorar e daí é que vamos partir para o futuro”, e em ideias políticas vigorosas sobre o sentido das melhorias que deviam ser encontradas.

Do extraordinário percurso de Castro Rodrigues em Angola, construtor de cidade e de arquitecturas notáveis no Lobito, podemos destacar:

* Bloco de habitação prédio do Sol (1952) “…de intensa modernidade” (J. M. Fernandes, 2005, p. 91);
* Jardim Infantil João de Deus (1955);
* Cine-Esplanada Flamingo no Lobito (1963) “com uma elegante pala em betão, tensionada por cabos” (J. M. Fernandes, 2005, p. 91);
* Mercado municipal do Lobito (1963) “de delicada escala e desenho” (J. M. Fernandes, 2005, p. 91)
* Aerogare do Lobito (1964) “um volume transparente com extensos planos de grelhagem para ventilação” (J. M. Fernandes, 2005, p. 91);
* Liceu do Lobito (1966);
* Auto silo da casa Americana (1970);
* Bairro municipal de autoconstrução do Alto do Liro 7 500 fogos (1970-1973) “inovador…percursor do que se fez em Portugal com o SAAL” (J. M. Fernandes, 2005, p. 91);
* Catedral de Sumbe ex-Novo Redondo (1972?)
* Liceu do Sumbe (1972-73);
* Paços do Concelho no Sumbe (?)
* Plano Director do Lobito aprovado em 1975 pelo governo da República de Angola .

Como tem sido destacado por J. M. Fernandes,
“Por um lado, o seu trabalho longo e contínuo no Lobito (depois de 75 parcialmente em Luanda) entre 1953 e 1987; por outro, a sua participação, decisiva e simultânea, nos planos municipal, urbanístico, infraestrutural e arquitectónico – tornaram Castro Rodrigues num verdadeiro “fazedor da cidade moderna” em relação ao Lobito.”
(Fernandes, J. M. – Arquitectura e Urbanismo na África Portuguesa. Lisboa: Caleidoscópio, 2005, p. 89)

O mesmo respeito que FCR mantinha pelas populações promovendo tanto quanto possível a auto-construção, o uso de materiais e técnicas locais, “aprendemos realmente, com as razões que o povo nos apresentou, a construir melhor”, e a participação, “a certa altura fazia-se o chamamento da população para discutir certos pontos do Plano Director, para falar”.
“A propósito das aldeias, comunais ou não” é o título de um trabalho que desenvolve para Agostinho Neto (198?) e um tema recorrente sobre o qual trabalha e que conclui com o exemplo dos processos experimentados no Alto do Liro.
Em 1979 integrou a Direcção Nacional de Edificações de Angola e mais tarde, até 1984, o Gabinete Regional de Urbanização de Benguela.
Em 1982 concluiu o estudo “História do Lubito e da Catumbela”.

FCR fixou-se em Portugal em 1987 e voltou a Angola (em 1993) para a assembleia popular lhe entregar um diploma como trabalhador de mérito."


Já agora, recomenda-se a leitura do livro referido de José Manuel Fernandes intitulado "Arquitectura e Urbanismo na África Portuguesa" da editora Caleidoscópio.

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