2011/06/10

Porquê 10 de Junho?

Dizem que é o dia de Camões. Segundo consta, morreu a 10 de Junho de 1580. Mas poucas certezas há sobre a sua vida. Certo só que terá escrito os Lusíadas, obra maior da literatura do renascimento em Portugal e no Mundo. Mas é um dia que só é comemorado desde 1924 enquanto tal, segundo li aqui, ou seja, é uma tradição com menos de 100 anos e amplificada pelo regime de Salazar - coisa que me faz ficar perplexo como a esquerda permitiu manter esta tradição e apenas lhe retirou a "raça" da comemoração (já que até 1978 era dia de Camões, de Portugal e da Raça!) que a II República tanto glorificou.


Mas daí até ser hoje o dia de Portugal, das Comunidades e de Camões, parece-me um excesso.

Porque nem sequer há certezas.

Mal por mal, incerteza por incerteza, prefiro o 24 de Junho, suposto dia da batalha ocorrida no campo de S. Mamede, em Guimarães, e que deu início segundo todos os relatos e mais ou menos unanimidade dos historiadores ao nosso país, Portugal, no já longinquo ano de 1128.

Quanto ao resto, parece-me bem que se comemore o dia da nação, que se festeje Portugal - mesmo que de forma contida porque não só a nossa independência já não é o que era (graças a quem nós sabemos) como a crise (graças a quem nós sabemos também) não o aconselha. Já agora, faltam 17 anos para comemorarmos os 900 anos de história enquanto nação. Que data fantástica será o ano de 2028, gostaria de cá estar para a celebrar também! Quem sabe nesse ano já se comemore em 24 de Junho o dia de Portugal!

Editado em 2011.06.12

4 comentários:

António Amaro das Neves disse...

Meu caro,

Só três notas sobre este assunto:

1. Ao dizer que a Batalha de S. Mamede é "suposta", parece indicar alguma dúvida em relação à sua ocorrência. Ora, não há nenhuma dúvida de que a Batalha de S. Mamede seja um facto histórico incontroverso.

2. Não me parece que exista "mais ou menos unanimidade", porque tenho para mim que ou há unanimidade, ou não há. Ora, entre os historiadores não há unanimidade quanto ao nascimento de Portugal em 1128. Há quem marque para ao efeito a Batalha de Ourique e há também que diga que foi com a Bula Manifestis Probatum que Portugal afirmou a sua independência. A propósito, recordo uma interessante (e controversa) intervenção do historiador A. H. de Oliveira Ramos no 2.º Congresso Histórico de Guimarães, em que defendeu que Portugal só nasceu depois de concluído o processo de Reconquista.

3. Quanto à defesa do 24 de Junho como Dia de Portugal, em substituição do 10 de Junho, nada tenho a obstar. É uma opinião absolutamente legítima. Todavia, julgo que haverá que ter algum cuidado com os argumentos que se usam em suas defesa, sob pena deles produzirem o efeito contrário. Explico porquê: não percebo o que é que a esquerda pudesse ter contra o 10 de Junho, já que ele começou a ser celebrado durante a Primeira República, como feriado da cidade de Lisboa e não no regime de Salazar; por outro lado, se diz que só começou a ser celebrado em 1924 (o que não é bem verdade, porque a data passou a ser celebrada em Lisboa desde a instituição dos feriados municipais, logo depois de 1910), é bom não esquecer que a comemoração da Batalha de S. Mamede começou a ser comemorada depois (a primeira vez, em Guimarães, foi no centenário, em 1928 e aconteceu no dia... 23 de Junho. E só muito mais tarde é que o 24 de Junho começou a ser feriado municipal em Guimarães (antes, calhava a 2 de Junho, em que se assinalava Gil Vicente).

Saudações cordiais

Nuno Leal disse...

Caro AAN, obrigado pelos comentários.
Em relação aos mesmos, alguns esclarecimentos.
O suposto refere-se quanto à data da batalha, pois tanto quanto eu saiba os poucos documentos que existem da época também não são conclusivos - pelo que fui lendo, a maior parte da história medieval da criação de Portugal foi escrita mais de 100 anos depois.
Sobre a unanimidade dos historiadores refiro-me à questão da batalha ter sido em Guimarães e ser a precursora do nascimento de Portugal - não digo que tenha sido o nascimento de Portugal nesse dia, apenas me parece quase consensual que essa batalha foi o primeiro momento que levou ao surgimento da nossa nação.
Em relação à questão da esquerda, apenas o disse porque o único documento que encontrei sobre o inicio da sua comemoração foi aquele que "linkei" e dizia ser a partir de 1924, já Salazar era PM. E foi ele que amplificou as comemorações dessa data de tal forma que durante muitos anos já na democracia havia até uma certa, digamos, vergonha, em comemorar esse dia, tal era o estigma de direita associado ao mesmo (ainda hoje essa é uma das datas preferidas da extrema-direita ilegalizada para se manifestar). Logo o mais natural no PREC seria mudar a data para outro dia...
Quanto à data comemorada em Guimarães ser mais ou menos recente, não me parece um problema - foi quando houve entendimento na cidade sobre a importância dessa data, que espero que venha a acontecer também no país porque acho que faz mais sentido. E se a data seria 23 e não 24 inicialmente, isso enquadra-se no que disse inicialmente sobre as escassas fontes da época.

António Amaro das Neves disse...

Meu caro Nuno Leal,

Não pretendo alimentar uma discussão no terreno da História em que, por razões óbvias, eu tenderia a usar um registo que pode ser confundido com sobranceria. Apenas deixarei algumas notas:

Não conheço, hoje, dúvidas entre os especialistas quanto à data da Batalha de S. Mamede. A discussão que se vai fazendo é quanto ao exacto local onde se travou, não se questionando que tenha sido em terras de Guimarães.

Quando notei que em Guimarães só há algumas décadas se assinala o 24 de Junho como feriado municipal, apenas pretendi notar que há argumentos que temos que usar com cuidado, porque se podem voltar contra quem os usa. Referia-me ao facto de o meu amigo ter escrito que o 10 de Junho "é um dia que só é comemorado desde 1924 enquanto tal" e "é uma tradição com menos de 100 anos". Apenas pretendi salientar que, se esse argumento retira legitimidade ao 10 de Junho, mais a retirará ao 24 de Junho, que só começou a ser comemorado depois. Mas este não é, como diz, um problema.

Problema já será dizer-se que a data do 10 de Junho foi "instituída pelo regime de Salazar", como escreveu antes, ou que "a partir de 1924, já Salazar era PM". Ora, assim usado, este é um argumento que não colhe, porque o seu pressuposto é errado. O derrube da Primeira República e a instauração da ditadura aconteceram a 28 de Maio de 1926 e só em 1932 é que Salazar assumiu a chefia do Governo. Portanto, em 1924 Salazar ainda estava longe de ser primeiro-ministro.

Do meu ponto de vista, esta não é, seguramente, uma discussão de natureza política, daquelas que separam a esquerda da direita.

Saudações cordiais

Nuno Leal disse...

Tem razão, estava convencido que Salazar era PM desde 1922, afinal era 32. Ligeira confusão, agradeço a sua rectificação.
Em todo o caso, quando digo que o 10 de Junho é uma tradição recente, não é por comparação com o 24 de Junho, é per si. Não se pode dizer que seja uma tradição antiga algo que nem 100 anos tenha. Há ainda pessoas vivas, e muitas, que assistiram às primeiras comemorações da data, daí apenas querer dizer que esse argumento, o da tradição, não colhe para a data ser mantida, independentemente da outra data que eu defendo ser comemorada há mais ou menos tempo que esta.
No mais, não o tomo por presunçoso, bem pelo contrário, vejo que é alguém entendido na matéria e conhecedor profundo, pelo que agradeço a contribuição que deu aqui.